Eduardo Souto de Moura – Biografia e obras
Por Victória Baggio
12 janeiro 2022
Portugal é um lugar que, ao longo do tempo, foi criando uma arquitetura própria, essencial e gentil. Atualmente, o país conta com um importante grupo de arquitetos e escritórios requisitados mundialmente, autores de belas obras intrínsecas ao lugar onde estão. Eduardo Souto de Moura está entre os mais relevantes arquitetos portugueses, cuja obra exalta precisão e simplicidade, características alcançadas a partir de uma maneira de projetar especial.
Com edifícios em todo território Português, e não só, Souto de Moura, que é colega de trabalho e amigo do renomado arquiteto Álvaro Siza Vieira, apresenta uma maneira particular de construir arquitetura, com cuidado à preexistência, à materialidade e às proporções, que faz do complexo jogo da arquitetura parecer ser muito mais simples do que realmente é.
Biografia de Eduardo Souto de Moura
Nascido na cidade do Porto, em Portugal, em 1952, filho de pai médico e mãe dona de casa, Eduardo Souto de Moura foi o primeiro da família a graduar-se no ramo das artes, no caso, arquitetura. Sua paixão por projetar e fazer arquitetura foi inspiração para seus descendentes, que decidiram seguir os caminhos no mesmo âmbito ⏤ das suas três filhas, duas são arquitetas.
Souto de Moura graduou-se em arquitetura na Escola de Belas Artes do Porto em 1980, e, a partir do ano seguinte, além de começar sua carreira como docente na mesma faculdade, iniciou a trabalhar no ateliê do arquiteto Álvaro Siza, que passou a ser, além de um mestre, um importante amigo e colega de profissão, cuja relação segue fazendo parte do dia a dia de ambos, compartilhando o mesmo edifício de escritórios e em projetos criados em conjunto.
Ainda jovem, Souto de Moura decide abrir seu próprio escritório, que logo no início já adquire certa relevância, ao ser premiado em concursos de projetos de arquitetura, tanto nacionais quanto internacionais, o que lhe abriu muitos caminhos no âmbito de obras públicas em Portugal.
Ao longo da sua trajetória, Souto de Moura logra algo particularmente difícil para um arquiteto contemporâneo, o equilíbrio entre obras públicas e privadas. Entre a extensa lista de edifícios construídos de sua autoria, observa-se certo ritmo intercalado entre casas unifamiliares e edifícios públicos de maior escala, cujo programa varia bastante, desde escolas, centros culturais e bibliotecas, por exemplo, espalhadas por todo território Português.
Em 2011, Eduardo Souto de Moura recebeu o Prêmio Pritzker, a mais importante premiação de arquitetura contemporânea, que, até o momento, o único arquiteto português que havia recebido o prêmio era Álvaro Siza. Tal acontecimento é algo notável para o arquiteto, que, na época, tinha apenas 50 anos, por ser um prêmio entregue, normalmente, a profissionais com idade mais avançada, o que também reforça a maturidade projetual do arquiteto.
Em 2018, Souto de Moura recebeu outro prêmio internacional também bastante relevante, o Leão de Ouro da Bienal de Arquitetura de Veneza.
Além do trabalho como arquiteto projetista, em seu ateliê com sede no Porto, Eduardo Souto de Moura também atua como professor tanto em sua cidade natal como professor visitante em escolas pelo mundo, o ETH Zurich, na Suíça, Paris-Belleville, na França, e Harvard, nos Estados Unidos, por exemplo.
Obras de Eduardo Souto de Moura
A obra de Eduardo Souto de Moura é reconhecida pela qualidade construtiva, alcançada a partir de maestria e rigor da técnica, além das suas proporções gentis,
tanto com quem a habita quanto com o lugar onde se encontra.
O modo de projetar do arquiteto parte também de um ritmo ortogonal, poucas linhas geométricas e tendência à horizontalidade, aspectos que mostram a importante influência do renomado modernista Mies van der Rohe. Mas, ao contrário do que a arquitetura modernista trouxe, fugindo a algo internacionalista e sem relação com o contexto imediato, Souto de Moura relaciona o conceito de modernidade aos valores próprios do lugar determinado em cada projeto, através da materialidade. É a partir deste modo moderno, que Souto de Moura retoma a tradição e a faz inovadora.
Além disso, outra clara referência que Souto de Moura carrega consigo é do arquiteto mexicano Luis Barragán, através do trabalho da arquitetura como massa construída, cuja composição de volumes resulta em um jogo de luz e de sombra. A diferença de Barragán, que trabalha com cores vivas, o arquiteto português marca a diferença entre planos através da sua materialidade, resultando em uma obra sutil e vernacular.
Com olhar atento aos recursos locais e possíveis preexistências, Souto de Moura apresenta várias obras que lidam a relação entre novo e antigo, pois o arquiteto enxerga em ruínas, um valor imperdível, revalorizado a partir de algo novo.
Casa das Artes, Porto
A Casa das Artes, localizada nos jardins de um palacete na cidade do Porto, em Portugal, concluída em 1991, foi a primeira obra de maior notoriedade de Souto de Moura.
O edifício abriga um pequeno centro cultural, que conta com uma extensa sala de exposições, e dois auditórios, e tem uma agenda cultural variada, de cinema, arte e arquitetura, o que faz da Casa das Artes um espaço de vida para a vida.
Ao exterior, a edificação baixa tende a mimetizar com o entorno, devido à pedra natural que reveste muros cegos das fachadas. O encontro de dois planos perpendiculares é feito a partir de planos de vidro espelhados, que refletem o jardim e ocultam o espaço interior.
Ao entrar no edifício, a horizontalidade toma conta do espaço, enfatizada a partir de elementos estruturais e de uma longa janela, que, como uma fita, recorre à sala de exposições.
Museu Abade Pedrosa
Localizado na hospedaria do antigo Mosteiro de São Bento, em Santo Tirso, o Museu Municipal Abade Pedrosa (MMAP) parte do princípio da preservação e reabilitação de tal patrimônio histórico, e funciona em conjunto com o museu contemporâneo, Museu Internacional de Escultura Contemporânea (MIEC).
Enquanto Souto de Moura se encarregava do projeto de reabilitação para o MMAP, Álvaro Siza projetava o seu novo vizinho, MIEC. O resultado em conjunto destes dois renomados arquitetos portugueses é um museu que se funde em outro, onde o limite entre os projetos é, por vezes, justo e preciso, e outrora parecem um só corpo.
Uma obra majestosa, que a simples vista parece tímida, mas que, em um olhar atento, transparece seu rigor técnico, cuidado e respeito com o antigo e com o outro.
Estádio Municipal de Braga
Para sediar o Campeonato Europeu de Futebol de 2004, o arquiteto Souto de Moura foi convidado para projetar um estádio de futebol na cidade de Braga, no interior norte de Portugal.
O terreno para o projeto era em um monte que havia sido, antigamente, uma pedreira. Tirando partido desta persistência local, o arquiteto decide construir um estádio tal como um antigo teatro grego, composto por duas arquibancadas, uma frente a outra. Uma delas surge a partir da pedra, escavando-a, enquanto a outra é construída a partir do chão, isolada. Vencendo o vão de 200 metros entre uma arquibancada e a outra, como elemento que as une, aparece uma cobertura suspensa por cabos.
Tal implantação faz com que o estádio se integre à paisagem, que passa a fazer parte deste, até não sabermos diferenciar o natural do construído.
A estrutura das arquibancadas passa a ser protagonista, em concreto armado aparente, projetada de modo a combinar função e estética, que resulta em um belo e preciso desenho.
Casa das Histórias, Cascais
A zona oeste de Lisboa, onde estão cidades turísticas como Cascais e Sintra, é famosa por seus castelos, torres e palacetes da idade média e posteriores, que fazem parte da história e da cultura local.
É em Cascais, charmosa pequena cidade litorânea, que o arquiteto Eduardo Souto de Moura, em 2008, é convidado para projetar um museu para abrigar a obra da artista portuguesa Paula Rego, além de funcionar como centro cultural e receber eventos artísticos variados na cidade.
Intitulada Casa das Histórias, o edifício de arquitetura contemporânea apresenta aspectos regionalistas em seu conceito. Souto de Moura projeta um museu conformado por quatro alas, dispostas como volumes separados, em torno a um núcleo principal, onde se localiza a sala de exposições temporárias.
O interior de paredes e teto brancos, com piso azul profundo, do mármore de Cascais, contrasta com seu exterior, de concreto pintado de vermelho, criando uma composição de cores entre o construído e o jardim verde, onde árvores preexistentes de grande porte criam um diálogo harmônico com a nova arquitetura.
Convento das Bernardas
Localizado em Tavira, no litoral Sul de Portugal, na região do Algarve, famosa pela sua paisagem natural e por praias deslumbrantes, encontrava-se em ruínas um antigo edifício do século XV.
Construído para abrigar o Convento das Bernardas, com o passar do tempo a construção já havia passado a ser utilizada como fábrica, e se encontrava utilizada há décadas, o que levou à degradação do patrimônio.
O projeto de intervenção do arquiteto Eduardo Souto de Moura no antigo convento partiu do conceito de restaurar a preexistência de modo a valorizar sua essência, de simplicidade e geometria rítmica.
Para o novo uso do Convento das Bernardas, o projeto propôs a criação de casas, de tipologia de estúdios e unidades de um e dois dormitórios, concedidas a partir da estrutura original do edifício.
No pátio central, um espelho d’água, uma piscina oferece o frescor muito bem-vindo ao lugar, ao lado de salinas. Com o passar do tempo, as fachadas puras são cobertas de verde e flores, a partir de trepadeiras em torno do edifício, enchendo-o de vida e cor.
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