Casa das Canoas – Que prédio é esse?

Casa das Canoas – Que prédio é esse?
Victória Baggio

Por Victória Baggio

31 outubro 2022

Casa das Canoas, onde a natureza encontra a arquitetura modernista de Oscar Niemeyer. Em um diálogo preciso e íntimo, as linhas construídas se fundem com a organicidade do entorno. O construído esconde-se entre o natural, suas curvas sutis revelam-se aos poucos, ao aproximar-se da paisagem. 

Como uma joia escondida na mata, o projeto do arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer é referência eterna de uma arquitetura modernista peculiar, intrínseca ao lugar a partir do qual pode existir. 

A Casa das Canoas

Escondida na mata tropical, em um terreno precioso, entre a Floresta da Tijuca e a praia de São Conrado, com vista para o mar, foi o lugar onde Niemeyer escolheu viver com a sua família até mudar-se para Brasília para trabalhar no projeto da nova capital do País. 

Imagem de uma parte externa da Casa das Canoas, onde conseguimos ver um pouco da piscina, a estátua, uma grande pedra e as árvores atrás.
 Casa das Canoas. Fonte: Nelson Kon

Construída em 1951, a Casa das Canoas parte de uma particularidade projetual, pois foi idealizada por Oscar Niemeyer como residência familiar para si. Um refúgio rodeado por natureza. Um lugar de tranquilidade e inspiração.

Situada na Estrada das Canoas, em um terreno de mata densa e rochas de dimensões importantes, a casa surge como elogio ao que lhe rodeia, ao natural, a partir de uma arquitetura modernista orgânica, com limites difusos e formas escultóricas próprias do arquiteto.  

Arquitetura e natureza

Em um lugar onde o solo é o protagonista, plano irregular de onde nasce a vegetação vibrante, a arquitetura parte de uma cobertura, uma laje de concreto plana, com perímetro orgânico, cuja curvatura se encaixa na massa arborizada que a rodeia.

A Casa das Canoas surge então de dois elementos maciços em constante diálogo, um natural e outro artificial, uma rocha existente e a laje da cobertura. 

Alguns desenhos feitos pelo arquiteto Oscar Niemeyer com ideias de como seria a casa.
Croquis de Oscar Niemeyer para o projeto da Casa das Canoas. Fonte: Archdaily

O artifício parece flutuar no lugar, efeito alcançado a partir de um preciso desenho de sua estrutura ⏤ onde a disposição de pilares tubulares pintados de tom escuro se confundem com os troncos das árvores em volta da casa. 

Sobretudo, uma casa que parte de uma rocha incrustada, uma rocha que possibilita o sutil desenho de uma casa.

A piscina é o terceiro elemento estruturador da Casa das Canoas, aparecendo como um pedaço de mar à beira da pedra. Seu perímetro orgânico dissolve-se ao encontro com a rocha, que serve de elemento de transição exterior e interior.

Entre o contraste e a semelhança, a Casa das Canoas estabelece uma relação própria com o seu entorno, busca refúgio, participa, convive e faz do natural parte dela, um elo tão íntimo que, na inexistência da mata, a casa não existiria.  

Espaços interiores em constante relação com o exterior 

A cobertura plana de perfil orgânico ampara a área social da casa, em constante relação com o exterior a partir de planos de vidro que vão de piso a teto, fixados a perfis metálicos esbeltos pintados de cor preta.

Imagem feita da parte interna da casa, mas que é possível ver a parte externa.
Diálogo entre interior e exterior na Casa das Canoas. Fonte: Nelson Kon

Esta transparência vertical possibilita visuais em atravessamento à casa; a luz natural banha os espaços cobertos, filtrada apenas pela vegetação que circunda a casa.

Um plano curvo, revestido de ripas de madeira, divide a sala de estar e jantar da zona da cozinha de maneira gentil, possibilitando uma relação fluida entre os ambientes. 

A cozinha semicircular, envidraçada até a altura da bancada, parece ir em busca da mata, que conforma a paisagem interior do espaço. 

Parte interna da casa, com piso escuro e o teto branco, móveis em madeira, espaço que dá acesso a sala de jantar.
Acesso e sala de jantar da Casa das Canoas. Fonte: Nelson Kon

O acesso da casa se confunde com varanda, sala de estar e de jantar, um espaço múltiplo, flexível, aberto, fluido, transparente. Polivalência característica da arquitetura modernista, que aqui recebe o presente do contexto tropical. 

O piso de acesso à casa, sem obstruções e desníveis, contribui para a fluidez espacial entre exterior e interior; a cor da cerâmica escura do revestimento confunde-se com a tonalidade da terra molhada da floresta e da rocha existente. 

Estratégias da arquitetura que se esconde no terreno 

Em contraposição à área social, transparente e aberta, a zona íntima da casa esconde-se buscando privacidade e aconchego.

Tal refúgio é possível a partir de uma estratégia projetual, que a concebe em um nível abaixo do acesso à casa, semienterrada. Recurso também utilizado com frequência na arquitetura modernista para possibilitar arquiteturas discretas, que, à primeira vista, parecem ter uma altura construída consideravelmente menor do que realmente tem.

Desenho de corte da Casa das Canoas.
Desenho de corte da Casa das Canoas. Fonte: Archdaily

O desenho tipo croqui do corte da Casa das Canoas permite a clara percepção do aproveitamento do desnível existente no terreno para a criação de um piso inferior, dessa forma, possibilita duas espacialidades opostas para a casa. 

O acesso ao piso inferior é feito a partir de uma escada de madeira, que acompanha a curvatura da rocha existente, fazendo-a parte do percurso. 

Escada para a área íntima da casa, com corrimão e spots de luz em alguns degraus da escada.
Escada para a área íntima da casa. Fonte: Nelson Kon

A escada é o elemento de transição da casa. O percurso, do público ao privado, transparente ao opaco, é projetado como um passeio; estabelece então, o tempo necessário para o morador realizar tal atravessamento de modo contínuo e sutil.   

Nesses espaços de intimidade, o vidro dá lugar à madeira, a iluminação franca a pontos de luz precisos e controlados, permitindo o aconchego próprio do morar.

A organicidade, aparece no andar inferior através das paredes curvas, aberturas circulares e mobiliário de madeira, tanto fixos como móveis. Uma casa em constante movimento, bem como a natureza que a rodeia. 

Biblioteca e espaço de relação entre ambientes íntimos da casa, com uma mesa cheia de livros em cima, um quadro na parede e, bem no meio do ambiente, uma espreguiçadeira.
Biblioteca e espaço de relação entre ambientes íntimos da casa. Fonte: Nelson Kon

Deste modo, a Casa das Canoas adquire duas personalidades: diurna e noturna, social e íntima, entre a liberdade e o amparo, possibilitando que a vida habitual aconteça de maneira descomplicada e espontânea, tal como o modo de viver carioca.   

Uma arquitetura modernista particular 

O Modernismo, estilo arquitetônico internacional do século XX, contemplou uma série de conceitos a partir dos quais a arquitetura era projetada, como, por exemplo, geometrias puras, formas simples, minimalismo espacial, estruturas de ferro, aberturas em fita ou como planos transparentes, e o distanciamento com o contexto imediato.

Obras famosas, como a Casa Farnsworth, do arquiteto Mies van der Rohe, exemplificam o caráter desses edifícios que pousam no terreno. Muitas vezes elas parecem flutuar sobre este, criados a partir de uma lógica abstrata que pouco dialoga com o seu entorno.

Imagem entre a parte interna e externa da Casa das Canoas, onde é possível ver que a casa é toda envolta com vidro, criando uma integração entre as duas partes.
Casa das Canoas. Fonte: Nelson Kon

Em contraposição a isto, embora a arquitetura de Oscar Niemeyer apresente traços evidentes modernistas, edifícios como a Casa das Canoas surgem através de uma emersão do próprio terreno. 

Intrínseca ao seu solo, onde a rocha natural faz parte da sua arquitetura e se confunde com o construído. 

A partir desse chão consolidado, aparece o visivelmente moderno da Casa das Canoas, sua cobertura de laje de concreto plana, apoiada em pilares metálicos tubulares dispostos de tal maneira que parecem dançar embaixo do plano, como, por exemplo, os elementos opacos, que funcionam independentes da estrutura. 

Uma arquitetura modernista própria, particular, um modernismo carioca, em que a natureza exuberante é partícipe da arquitetura. 

Visitar a Casa das Canoas

Desde 2007, quando o arquiteto completou 100 anos, a Casa das Canoas foi tombada como patrimônio nacional e, atualmente, é administrada pela Fundação Oscar Niemeyer

Desde então, a casa passou por manutenções, períodos de fechamento e de abertura ao público.  

Atualmente é um espaço a ser visitado pelos amantes de arquitetura, como um pequeno exemplar de uma casa modernista que se manteve apesar do tempo. 

Como chegar na Casa das Canos

Antes de ir à casa, na Estrada das Canoas, nº 2310, recomenda-se entrar em contato com a Fundação através do e-mail para confirmar o horário. 

A Casa das Canoas hoje em dia é como uma viagem ao passado que é contemporâneo e evidencia um projeto para além do seu tempo.  

Endereço da entrada principal: Estrada das Canoas, nº 2310 São Conrado, Rio de Janeiro, RJ

Telefone: (21) 2509-1844

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Victória Baggio
Conteúdo criado por:Victória Baggio
Arquiteta com formação no Uruguai e Portugal, atualmente mestranda em projeto de arquitetura. Apaixonada pelo fazer e escrever sobre arquitetura.

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