Eduardo Kobra – Biografia e obras
Por Giovana Costa
13 fevereiro 2021
Conhecido como um dos mais influentes muralistas do mundo, Eduardo Kobra carrega a arte e a sua paixão pelo grafite brasileiro por todos os países por onde passa, registrando suas obras em diversos espaços ao redor do mundo.
Você certamente já se deparou com algum mural do artista. O hiper-realismo das imagens, muitas vezes baseadas em fotos, assim como as cores fortes do seu trabalho, contrastantes e hipnotizantes, podem ser facilmente reconhecidos.
Confira, a seguir, a história de vida e as obras mais marcantes do muralista Eduardo Kobra.
Os primeiros contatos com a arte
Nascido no dia 1° de janeiro de 1975, no Jardim Martinica, região do Campo Limpo, na periferia da zona sul paulistana, Carlos Eduardo Fernandes Léo transformou a arte brasileira, contribuindo para o reconhecimento do grafite como uma expressão artística livre e valorizada.
Filho de um tapeceiro e de uma dona de casa, Eduardo Kobra enxergou na simplicidade a beleza e a espontaneidade da arte de rua e, desde então, por meio de seu talento e sua dedicação, contribui frequentemente com a valorização do grafite como arte, em sua máxima potência.
Ainda quando estudava na escola pública Mauricio Simão, durante sua adolescência, o artista já criava desenhos e gostava muito de “rabiscar”, como ele mesmo se refere às suas primeiras experimentações.
Seus primeiros traços foram feitos com um grupo de garotos mais velhos, quando ainda se identificava como pichador.
Foi também durante essa época que ganhou seu apelido Cobra (escrito com “c” mesmo), pois, de acordo com seus colegas, o garoto era “cobra” na arte de desenhar.
Com tinta spray, ele costumava fazer desenhos na escola e também no bairro. As suas primeiras intervenções artísticas na rua, que numa época mais restritiva eram fortemente desprezadas e, até mesmo, criminalizadas, acabaram o levando a ser autuado algumas vezes.
Neste mesmo momento, alguns grafites começaram a surgir. Tímidos e ainda num momento de transição entre segmentos artísticos, mas já indicavam a perspectiva que o artista teria mais tarde.
Os novos rumos na carreira de Eduardo Kobra
Apesar das dificuldades em relação à marginalização das intervenções artísticas, o artista continuou no ramo da arte de rua, até que em 1990 passou a desenhar seus traços e suas ideias em cartazes de eventos, cenários de brinquedos e placas decorativas para o parque de diversões PlayCenter.
Logo depois, outros parques passaram a convidá-lo para produzir desenhos e ilustrações, como o Beto Carrero World, em Santa Catarina, e o Hopi Hari, no município de Vinhedo.
O empenho nesses trabalhos resultou em novas contratações. Assim, Kobra logo recebeu novos convites para atuar em outras empresas e também para contribuir com algumas produções de agências de publicidade.
Kobra costumava investir todo o dinheiro que recebia dos trabalhos em mais materiais para aperfeiçoar suas técnicas e ir além dos seus próprios processos.
Inclusive, essa experiência o ajudou ainda mais a aprimorar seus aprendizados. Pois, além das experimentações, como um bom autodidata, ele também era muito observador, característica que o ajudou a ampliar suas referências.
Inspirado por artistas como o britânico Bansky, o mexicano Diego Riveira, os norte-americanos Eric Grohe, Jean-Michel Basquiat e Keith Haring, o muralista também foi influenciado pelo hip-hop, o qual contribuiu para criação de murais coloridos, uma de suas principais marcas até os dias de hoje.
Até que em 1995, ele fundou o Estúdio Kobra, com o objetivo de focar na produção de painéis artísticos.
A trajetória como muralista
Nos anos 2000, o trabalho de Eduardo Kobra passou a ganhar cada vez mais visibilidade, por meio de seus destaques na arte de rua, da censura que seus trabalhos recebia para dar lugar à propaganda eleitoral ou por trabalhos coletivos com seus colegas muralistas, como a obra em Pinheiros: um mural em homenagem aos 450 anos de São Paulo.
E foi a partir de uma produção mais focada em um meio que Kobra fez um de seus primeiros projetos mais marcantes: o Muro das Memórias, o qual retrata cenas da cidade de São Paulo na primeira metade do século XX, com foco na reflexão sobre a calmaria das cidades no passado.
Por mais de 20 pontos em bairros diferentes, o projeto chamou a atenção do público e da mídia.
Inspirado por imagens retrô, neste projeto, o muralista utilizou fotos antigas de São Paulo e passou a reproduzi-las nas ruas em preto e branco ou em tons de sépia, apresentando um estilo de grafite diferente daquele que podia ser observado na cidade.
Em seguida, Kobra realizou um trabalho para o Shopping Center 3, na Avenida Paulista. A beleza do seu traçado, o delicado resgate ao passado e o tamanho da obra chamaram a atenção da mídia: 3,35 metros de altura por 8,80 de largura para reproduzir uma foto da Avenida Paulista na década de 20.
O projeto Muro das Memórias foi um divisor de águas em sua carreira, pois, a partir desse momento, Kobra se tornou um grande pesquisador de imagens históricas, fato que se reflete até os dias de hoje em diversas de suas obras e também contribui com o resgate da sensação de pertencimento dos habitantes.
A partir desse momento, a releitura de fotos antigas e as imagens de personalidades históricas passaram a se tornar uma das características mais marcantes de suas obras, que também se tornaram marcantes pela atualidade das figuras retratadas e pela promoção da reflexão.
A partir deste novo estilo, tão predominante em sua carreira e tão único por cores e imagens hiper-realistas, Kobra homenageia diversas figuras até os dias de hoje, como: Ayrton Senna, Frida Kahlo, Chico Buarque, Tom Zé, Albert Einstein, Ariano Suassuna, Salvador Dalí e outras mais.
Seu trabalho tem um foco muito específico em personalidades históricas, por exemplo: Mahatma Gandhi, Nelson Mandela, Malala Yousafzai, Madre Teresa de Calcutá, Martin Luther King e Dalai Lama, que aparecem no painel Olhares da Paz, uma celebração à paz e à união dos povos, simbolizados pelos vencedores do Prêmio Nobel da Paz.
Assim como suas obras também homenageiam o cotidiano e celebram os profissionais do dia a dia, como sugere a obra Dr. Edson (2019), em São Paulo, e até mesmo a literatura nacional e as cidades, como o mural Riquezas de São Luís (2017), no bairro Ponta D’Areia, em Maranhão.
Eduardo Kobra também se envolveu com a pintura tridimensional de street art, em 2009.
Primeiro, o artista realizou diversos testes e depois passou a expor a pintura 3D nas ruas, tanto no Brasil, começando com a Avenida Paulista, como em exposições ao redor do mundo, participando de festivais em Dubai e nos Estados Unidos.
Eduardo Kobra também dedicou suas obras a importantes causas, como questões ambientais sobre sustentabilidade, ganhando destaque o projeto Greenpincel, que levou painéis a diversos espaços, no Brasil e também na Grécia, para nos trazer reflexões sobre questões pautadas na poluição, no aquecimento global, no desmatamento e na ecologia.
Em 2011, o artista levou seu trabalho para a França, em Lyon, quando criou um paredão revitalizado, numa versão francesa do Muro das Memórias, que o consagrou.
A partir disso, ele realizou trabalhos similares em diversos países, como Noruega, Espanha, Malaui, Itália, Japão, Emirados Árabes, Índia e em outras diversas cidades norte-americanas.
Sempre muito envolvido com causas sociais, em 2015, Eduardo Kobra se dedicou ao projeto Realidade Aumentada, no qual o artista pintou dez painéis em dez dias, com o intuito de chamar a atenção da população a problemas sociais.
Em 2016, seu trabalho ganhou ainda mais notoriedade ao ser convidado a criar um mural para os Jogos Olímpicos do Rio. Com 3 mil m², a obra, intitulada Etnias, foi pintada nas paredes de um antigo armazém na região da Zona Portuária do Rio de Janeiro.
Com tamanha beleza e estatura, o mural logo se tornou o maior grafite já realizado no planeta, recorde que foi oficializado em agosto de 2016 pelo Guinness Book, o livro dos recordes.
Entretanto, Kobra bateu seu próprio recorde em 2017, com a obra Cacau, que ocupa um paredão de 5.742 m² às margens da Rodovia Castello Branco, na Região Metropolitana de São Paulo. Foram utilizadas 2.800 latas de spray para pintura desse mural.
Por meio de seu talento, seu olhar sensível e uma perspectiva de mundo humana, Eduardo Kobra aliou a simplicidade da sua origem à sua capacidade de observação e criatividade, criando uma identidade muito única e singular para a sua arte.
Obras de Eduardo Kobra
É bem provável que você já tenha visto algumas das obras do muralista. Afinal, além da sua produção no Brasil, Kobra também expõe sua street art em diversos países ao redor do mundo.
Agora que você já conhece um pouco mais da trajetória de Eduardo Kobra, confira, a seguir, algumas de suas obras internacionais.
Monte Rushmore – Chelsea, Nova York, Estados Unidos
O Monte Rushmore, em Keystone, no estado americano de Dakota do Sul, é uma obra do artista Gutzon Borglum (1867-1941) e retrata a imagem de quatro presidentes dos Estados Unidos: George Washington (1732-1799), Thomas Jefferson (1743-1826), Theodore Roosevelt (1858-1919) e Abraham Lincoln (1809-1865).
Eduardo Kobra fez uma releitura do monte rochoso esculpido por meio das cores e dos seus traços inconfundíveis, em um painel de 150 metros, na cidade de Nova York.
Em sua versão, Kobra retrata, em grandes proporções, quatro personagens do mundo das artes: Andy Warhol (1928-1987), Frida Kahlo (1907-1954), Keith Haring (1958-1990) e Jean-Michel Basquiat (1960-1988).
“Aludir ao Monte Rushmore é lembrar dos valores desses quatro presidentes americanos, tão profundamente ligados a ideais de liberdade, democracia, igualdade e paz… Ao colocar em seus lugares quatro artistas pelos quais tenho grande admiração, empresto suas memórias, lembrando das obras de arte que eles fizeram e que tanto colocaram o mundo para refletir.”, afirma o artista, em seu site oficial.
Let me be myself – Amsterdã, Holanda
Ainda quando estava produzindo o projeto Olhares da Paz, Kobra já tinha em mente retratar Anne Frank, adolescente judia vítima do Holocausto, que logo se tornou um símbolo universal de resistência e força.
Então, ao ser convidado para produzir um mural em Amsterdã, cidade natal e onde ficava o anexo secreto de Anne Frank, o artista escolheu o tema.
Entretanto, surpreendentemente, as autoridades locais, como a prefeitura de Amsterdã, o Comitê de Organização do bairro NDSM-Werf, a Casa de Anne Frank e, inclusive, o Street Art Museum holandês (responsável pelo convite a Kobra), sugeriram substituir a ideia e retratar o filósofo holandês Spinoza, pois temiam que fossem feitas manifestações contrárias de grupos religiosos.
Mesmo assim, o painel em homenagem à menina foi realizado e suas cores e seus 240 m² são responsáveis por emocionar a todos(as) que observam a obra.
Stop Wars – Wynwood, Miami, Flórida, Estados Unidos
Situado no distrito de Wynwood, o muro de um quarteirão inteiro, compondo 80 metros de composição, entre os painéis Dê uma chance à paz, com o retrato de John Lennon e Yoko Ono; a série Artistas, com Salvador Dalí, Jean-Michel Basquiat, Frida Kahlo e Andy Warhol; e o grafite O anjo caído, encontra-se o painel Stop Wars.
Feito em 2015 e protagonizado por mestre Yoda, um dos personagens mais queridos da saga de filmes Star Wars, o painel apresenta uma troca de palavras interessante. A mensagem “parem as guerras” é o pedido que o mestre Jedi faz a todos que observam a obra.
Mas, afinal, quem negaria um pedido do mestre mais sábio de toda a galáxia?
Davi, em Carrara, na Itália
Com 12 metros de altura e 20 de largura, a obra Davi está situada no alto de uma montanha em Carrara, na Itália, a mil metros de altitude.
Kobra e sua equipe enfrentaram altas temperaturas, estradas estreitas e, até mesmo, a falta de banheiros para conseguir criar esta pintura.
Prestando uma homenagem, a pintura de Davi foi feita diretamente no mármore da pedreira, no local que é conhecido como o predileto de Michelangelo e outros artistas, os quais buscavam ali o mármore utilizado em suas obras.
Cristo – Tóquio, Japão
Uma das composições mais trabalhosas de sua carreira, a obra Cristo foi feita em um horário um pouco diferente do que Kobra e sua equipe estavam habituados, pois a permissão para pintar foi concedida somente nas madrugadas, mais precisamente da meia-noite às cinco da manhã.
Situada em Tóquio, no Japão, a obra consiste em uma representação de alguns dos símbolos da Cidade Maravilhosa. A ideia surgiu ainda um pouco antes dos Jogos Olímpicos no Rio, em 2016, quando Kobra decidiu retratar o Rio de Janeiro em Tóquio, sede das Olimpíadas de 2021.
Fique de olho na cidade!
O artista foi capaz de mostrar que a partir de oportunidades reais e através da valorização da liberdade que a expressão artística do grafite carrega, é possível tornar o mundo um lugar um pouco mais colorido e com mais esperança.
Suas obras podem ser facilmente encontradas nas cidades brasileiras. Por isso, da próxima vez que sair para dar um passeio pela cidade, fica a dica: fique atento(a) e observe os grafites que ilustram a paisagem urbana. Você certamente se encantará!
Já conhecia a arte de Eduardo Kobra? Qual é a sua obra favorita? Deixe seu comentário abaixo.
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