Raquel Rolnik – Biografia e obras

Raquel Rolnik – Biografia e obras
Giovana Costa

Por Giovana Costa

18 janeiro 2021

Arquiteta, urbanista e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de São Paulo (USP) desde 1979, Raquel Rolnik reúne em sua trajetória diversas reflexões sobre a relação da cidade com seus habitantes, o direito à moradia, a ocupação dos espaços e o urbanismo.

Nascida em 1956, autora de obras renomadas e grande defensora da democratização dos espaços urbanos, a arquiteta afirma que a história das suas reflexões sobre a cidade e a política urbana são totalmente indissociáveis de um ativismo em torno do direito à cidade e à moradia para todos.

“Trata-se de uma luta incansável para conseguir fazer com que a cidade seja de todos”, afirma a arquiteta na sua entrevista para o canal Leituras Brasileiras.

Rolnik se intitula uma apaixonada pelas cidades, sobretudo pela cidade de São Paulo, por ser o local onde ela nasceu e sobre o qual desenvolveu a maior parte de suas pesquisas. Ela carinhosamente apelida São Paulo de “objeto de reflexão e de ação”. 

O início da trajetória de Raquel Rolnik

A trajetória de Raquel Rolnik na arquitetura e no urbanismo se inicia quando ela ainda era estudante na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de São Paulo (USP), onde a inspiração começava nos espaços e ia para além do campus, em uma verdadeira espiral de conhecimento.

Apesar de cursar a faculdade em 1970 ⏤ período marcado pela luta contra a ditadura militar brasileira, num momento em que nossa sociedade estava começando a se reorganizar do ponto de vista político e a recriar suas instituições de representação ⏤ de acordo com Rolnik, estudar num edifício projetado por Vilanova Artigas, arquiteto modernista que influenciou sua geração, foi muito inspirador.

“… É um edifício sem portas, como se fosse um templo. É um edifício praça. É um edifício onde os espaços de convívio e de circulação e de encontro estruturam aquele lugar. Pra mim o edifício é uma lição de arquitetura e urbanismo. Talvez a primeira mais consistente que determinou a forma como eu comecei a olhar a cidade…”, afirma Rolnik.

Raquel Rolnik participa de um debate sobre a cidade de São Paulo.
Raquel Rolnik participa de um debate sobre a cidade de São Paulo. Fonte: CAU/BR

Ainda nesse período de reestruturação, durante a ditadura, as entidades estudantis estavam se articulando e, assim, a urbanista pôde fazer parte desse momento da cidade, percebendo e estudando o conjunto de moradores que moravam em assentamentos informais, em favelas e ocupações, e que procuravam formas de se organizar para reivindicar sua participação em São Paulo. 

Esse foi um período de muito aprendizado, o qual, inclusive, a inspirou a escrever seu primeiro livro, intitulado Periferias – sobre a mercantilização da habitação operária (1978), com objetivo de pensar a periferia como um modelo de desenvolvimento urbano e refletir a oposição entre centro e periferia como modelo predominante, pensando no período do final dos anos 1970.

Alguns anos depois, Rolnik publicou um livro muito importante em sua trajetória: O que é cidade (1988), sendo um verdadeiro mergulho nas metrópoles, pensando sobre suas origens e suas contradições.

A eterna relação com São Paulo

Com toda a vivência desde a faculdade, passando pelo olhar voltado à periferia, Rolnik nunca mais se afastou dos estudos sobre São Paulo, os quais duraram quatro décadas.

Em seu livro Territórios em conflito: São Paulo – espaço, história e política (2017), lançado no mesmo ano da sua Titulação pela FAU, a arquiteta relata todo o processo e os resultados dessa trajetória de quatro décadas de estudo sobre a cidade, iniciando suas reflexões acerca da periferia e da luta pela inclusão socioterritorial em São Paulo.

Nesse período, surge uma agenda focada na reforma urbana que começa a ser formulada no País, com objetivo de desenvolver políticas urbanas de moradia e gestão municipal capazes de promover uma inclusão socioterritorial.

Raquel Rolnik durante um debate na Faculdade de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Raquel Rolnik durante um debate na Faculdade de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Fonte: UFRGS 

A partir desse momento, Raquel Rolnik passou a atuar além do campo da reflexão sobre a cidade, tornou-se Diretora de Planejamento do município de São Paulo durante a gestão da então prefeita de São Paulo, Luíza Erundina (atuação de 1989 a 1992).

A experiência lhe proporcionou muito mais conhecimento sobre o funcionamento da gestão e, além disso, a partir dessa experiência, Rolnik escreveu mais um trabalho sobre a cidade, o qual se tornou sua tese de doutorado pela New York University (NYU), nos Estados Unidos. Trata-se do livro A cidade e a lei: Legislação, política urbana e territórios na cidade de São Paulo (1997).

Nesta obra, Raquel Rolnik retrata outro modo de pensar São Paulo, diferente daquele que enxerga a cidade como um espaço mal planejado e sem regras. Ela enxerga o potencial desperdiçado de uma São Paulo que permanentemente acaba cedendo a um modelo de exclusão, no qual as regras atendem somente a uma parcela da população.

Por isso, a arquiteta insiste no entendimento sobre a geografia sociopolítica territorial da cidade, partindo de suas origens, de como foi construída e quais são os espaços que a constituem. Dessa forma, ela ainda analisa alguns elementos essenciais para entender quais mecanismos da desigualdade atenuam seus problemas, incluindo questões étnico-raciais.

A luta de Raquel Rolnik pela reforma urbana

Nos anos 1990, Rolnik fez diversas viagens pela América Latina, ao passo que estava lutando ativamente pelas reformas urbanas, realizando um trabalho de consultoria de cidades brasileiras e latino-americanas em política urbana e habitacional.

Por meio de uma nova legislação junto ao Congresso, o objetivo era transformar o marco regulatório e o estatuto da cidade de São Paulo em um processo de decisão mais democrático sobre as políticas territoriais, apostando em uma gestão mais participativa.

De acordo com a arquiteta, tudo isso foi possível, mas ela revela que a transformação não aconteceu efetivamente: 

“… Isso não foi capaz de transformar nossas cidades num sentido de promover a inclusão socioterritorial, e muito menos uma democracia alargada… O processo decisório do que será feito na cidade está muito mais relacionado a esta relação entre o Estado e os interesses privados, do que qualquer processo participativo de discussão pública com os cidadãos.”, revelou em entrevista para o canal Leituras Brasileiras.

Essa frustração aconteceu durante o momento no qual ela era Secretária Nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades, no primeiro mandato do então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (atuação de 2003 a 2007) e, desde então, suas reflexões tomaram novos rumos.

Raquel Rolnik por Repórter Brasil.
A cidade sempre foi um dos maiores focos de reflexão. Fonte: Repórter Brasil

Seus estudos tomaram como foco os possíveis motivos que barraram a implementação da agenda de reforma urbana na cidade de São Paulo. Assim, no começo da segunda gestão, após concluir o primeiro mandato, Raquel Rolnik deixou o Ministério.

Mas não foi somente sua partida que marcou esse momento da sua trajetória, ela foi indicada pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU a ser Relatora Internacional do Direito à Moradia Adequada do Conselho de Direitos Humanos (2008 – 2014).

Segundo a urbanista, esse momento foi fundamental, não somente por a ter salvado da depressão que enfrentou após o episódio da reforma urbana e a decepção que sentiu, mas também porque a deu uma perspectiva internacional sobre toda a situação.

Assim surgiu sua tese de livre docência apresentada na FAU, que posteriormente se tornou o livro o qual foi intitulado de Guerra dos lugares: A colonização da terra e da moradia na era das finanças (2015). Nas palavras da própria autora: “Este livro olha a transformação da moradia e da terra urbana em um ativo financeiro na era do capitalismo financeiro global”, com o intuito de analisar a subordinação que envolve os espaços da cidade.

Atuação marcante

Atualmente, além de atuar como professora universitária, Raquel Rolnik é chefe do Departamento de Projeto da FAU e autora de diversos livros e artigos sobre a questão urbana, sendo bolsista de produção de pesquisa do CNPq 1C desde 2011.

Além disso, também colabora com a Folha de S. Paulo, o portal Yahoo, a editoria A Cidade É Nossa do portal Uol e mantém o Blog da Raquel Rolnik, no qual escreve regularmente sobre questões urbanas.

Raquel por Revista Trip.
A arquiteta atua até os dias de hoje contribuindo com a sociedade por meio de suas reflexões e seus estudos. Fonte: Revista Trip

Raquel Rolnik segue estudando a cidade, a fim de pensá-la para as pessoas, sempre considerando o seu enorme potencial quando o assunto é o processo de transformação.

O olhar atencioso e repleto de amor pelas cidades, sobretudo São Paulo, estende-se ao longo de sua trajetória e se reflete numa admirável carreira incansável, corajosa e repleta de lutas e reflexões essenciais em prol da mudança e do desenvolvimento.

Gostou do conteúdo? Conheça a trajetória e carreira de outros arquitetos e urbanistas, confira a nossa série Biografia e Obras:

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Conteúdo criado por:Giovana Costa
Jornalista, apaixonada pela escrita, pela sétima arte e pelo audiovisual.

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